terça-feira, 21 de julho de 2015

Mário Ferreira dos Santos - O ISAGOGE de Porfírio. [...]

Notícias biográficas sobre PORFÍRIO:

PORFÍRIO, cujo nome próprio era Malco, nasceu por volta de 233, tendo falecido, possivelmente, em 304 d. C. Era natural de Tiro ou de Batânia (Síria). 

Iniciou os seus estudos em Alexandria, onde teve por mestre Orígenes e, posteriormente, em Atenas, Longino Cássio, o  retórico, e o  gramático Demétrio. Em 206, foi para Roma, onde se tornou discípulo do grande Plotino de Licópolis, recebido, então, devido à ausência deste, por Amélio. Esteve seis anos nessa escola, devotando-se a uma vida  ascética, que o levou certa ocasião ao desespero, do qual quis evadir -se pelo suicídio.

Graças à intervenção de Plotino, retirou-se para Lilibéia, na Sicília, onde se demorou por algum tempo, até à morte de seu mestre (270). Dirigiu-se, depois, para a África, retornando, afinal, para Roma, onde assumiu a direcção da escola de Plotino.

Escritor enciclopédico, escreveu cerca de 77 obras, das quais poucas chegaram até nós. Tentou uma conciliação entre Platão e Aristóteles, iniciando a série dos grandes comentaristas neoplatônicos, com a obra que ora publicamos "Introducção às Categorias de Aristóteles (Isagoge, em grego, introducção)", que foi traduzida para o latim por Mário Victorino e por Boécio, com edições posteriores em vários idiomas. 

O papel dessa obra, desde então, foi imenso, sobretudo por ter inaugurado, na Idade Média, a grande controvérsia sobre os conceitos universais. Das obras que escreveu citam-se como as principais: "Da Filosofia extraída dos Oráculos", "História da Filosofia", na qual consta a sua famosa "Vida de Pitágoras", "Introducção à Astrologia", "Questões Homéricas", "Comentários aos Harmônicos de Ptolomeu", "Sobre as imagens de Deus", "Contra os cristãos", em 15 livros, "Sobre o retorno da alma a Deus", "Carta ao sacerdote Anébon", "Sentenças introductórias ao inteligível" e publicou, segundo o ditado de seu mestre Plotino, as Enêadas, das quais nos chegaram apenas seis das nove, precedida por uma "Vida de Plotino", que se tornou famosa.

Filosoficamente, sua doutrina é a plotineana, dando maior relevo, porém, ao ascetismo, e devotando-se à defesa das práticas religiosas pagãs. Para melhor compreensão de sua filosofia, damos mais abaixo uma rápida biografia de Plotino.

Contudo, é mister ressaltar alguns aspectos mais importantes e até pessoais de sua filosofia, como a tendência a salientar a distinção real -real, e até a contraposição entre alma e corpo.

Na Moral, a salvação se obtém através do auto-conhecimento e pela purificação e pelo conhecimento  de Deus, devendo a alma libertar-se do corpo para retornar ao primeiro princípio (Deus), de onde proveio. Para tanto, é mister cumprir e activar certas virtudes. Em primeiro lugar, as  virtudes políticas, pelas quais o homem viverá de acordo com as leis da natureza, tornando-o honesto; em segundo lugar, as virtudes catárticas, as que purificam a alma, que tornam o homem um demônio bom, libertando-a das paixões; em terceiro lugar, as  virtudes contemplativas, pelas quais a alma opera pela inteligência, que tornam o homem  divino, e finalmente, pelas  virtudes exemplares  ou  paradigmáticas, que são próprias da inteligência enquanto tal, e que o tornam deus-pai.

A prática dessas virtudes é própria do homem sábio.
Foram seus discípulos Crisaórios, Gauro, Gedálio, Nemércio e Jâmblico.

PLOTINO DE LICÓPOLIS
Plotino (204-270 d. C., natural de Licópolis, Egito). Em Roma, Plotino fundou sua escola, na qual professou até o fim da vida.

Teve como discípulos, além de Porfírio, que recompilou sua filosofia, em  seis Enêadas, divididas em nove tratados cada uma, Amélio de Etrúria, o médico alexandrino Eustóquio, o poeta Zótico e alguns senadores e pessoas influentes na casa imperial romana.

Examinemos os temas principais da doutrina de Plotino:

a)  Com  P., e também com Proclo, o neoplatonismo empreende uma grande especulação final religiosa. Tudo vem de Deus por graus e tudo volve, por graus, a ele. A unidade universal se estabelece na continuidade do círculo, que une o tér-mino com o princípio.

b)  O princípio é Deus. Acentua P. sua transcendência. Deus é incognoscível e inefável para os homens, e coloca-o acima de todas as determinações que possamos conceber do ser, da essência, do pensamento, da vontade, etc. Podemos de Deus dizer o que não é, nunca o  que é. Para falarmos de Deus, temos que usar nossos termos inferiores e compará-lo ao inferior, chamando-o o Um, Bem, Acto Puro, etc. Com isso não expressamos a Deus, mas a necessidade e a aspiração das coisas inferiores, que só podem subsistir pelo apoio da Unidade, do Bem, do Acto Puro. Deus coloca-se, assim, além de qualquer determinação.

c)  É Deus a fonte de todos os seres. Embora não tenha necessidade de movimento e câmbio, dele emana uma série de outros seres numa procissão descendente. A emanação deriva desde a essência de Deus, enquanto ele permanece, em si, no acto de sua essência. 

Assim,  do  fogo que permanece, em si, fogo, emana o calor, ou o sol que, permanecendo sol, em si,  espalha  sua luz em todas as direções. Todas as coisas procedem  de Deus, e sem ele não se manteriam, mas Deus transcende a todas as coisas. É progressiva a descida dos seres. Assim como a luz vai debilitando-se e obscurecendo-se, quanto mais se afasta de sua fonte, assim, afastando-se da fonte da Unidade e da Perfeição, os seres vão aumentando em multiplicidade.


Três graus tem esse descer do Um: 1) Intelecto; 2) Alma universal; 3) Mundo corpóreo.



Os dois primeiros formam com o Um a Trindade divina das substâncias ou hipóstases, o terceiro é o último dos entes, fora  do mundo inteligível e em contacto com a matéria, que não é corporeidade, mas absoluto não-ser, e, por isso, mal absoluto

d)  O Intelecto é filho e Verbo do Um (Pai). O filho é imagem do pai, porque este é inteligível puro, e o filho é ao mesmo tempo inteligível e intelecto, ser e pensamento, objecto e sujeito. Todos os inteligíveis estão reduzidos à unidade e compenetrados nela.

Como unidade, o  Intelecto é imagem do Pai; como totalidade, é exemplar da terceira hipóstase divina, Alma do Mundo, no qual a totalidade, embora sem dividir-se em si, se distribui na multiplicidade.

e) O mundo corpóreo, último degrau da descida do ser, está possuído pela alma que não a possui como coisa sua. Todas as coisas de que se compõe o mundo, derivam da unidade da Alma, unidade vivente. 

Da matéria provém a divisão, a discórdia, porque a matéria é o absoluto mal e não-ser, degrau último de todas as coisas, limite final da descida. Mas é, na matéria, que se inicia o retorno, porque o mundo corpóreo é vivente, e o verdadeiro ser do vivente é a alma. Se a alma perde a consciência da unidade universal nos seres individuais, cai no pecado do orgulho da individualidade, convertendo-se em prisioneira da matéria, que é a negação da unidade, condenando-se, assim, à série das  transmigrações dos corpos. Mas, na expiação do pecado, a alma é purificada. Reconhecendo a vaidade da vida terrena, volve a penetrar em si mesma e sente a exigência íntima da natureza divina.

 Assim, a passagem do pecado à virtude é a purificação, enquanto liberação da espiritualidade de qualquer sujeito do corpo. Com essa purificação, a alma inicia sua conversão a Deus, que se realiza por três caminhos ascendentes: contemplação da harmonia (música) da beleza espiritual (amor), da virtude inteligível (filosofia).

Mas acima desses três caminhos, há ainda outro superior, a suprema conversão, a união com Deus, a imanência da alma em Deus, que se processa pelo êxtase. Com esse retorno é fechado o círculo

O ISAGOGE de Porfírio

Essa obra (INTRODUCÇÃO ÀS CATEGORIAS DE ARISTÓTELES = Isagoge) é uma preparação para o estudo das categorias, que abre o famoso ORGANON de Aristóteles.

 É a Lógica uma ciência e arte introductória ao estudo da Ciência. Pretende com ela Porfírio introduzir, pelo exame dos cinco  PRAEDICABILIA (GÊNERO, ESPÉCIE, DIFERENÇA, PRÓPRIO E ACCIDENTE), o estudo da Lógica aristotélica,  em cuja classificação ordena os PRAEDICAMENTA (KATHEGORIAI) de Aristóteles.

Sua obra pode ser dividida em três partes: na primeira, explica a sua intenção pelo prefácio; na segunda trata simplesmente dos PRAEDICABILIA e os explica; na terceira, examina os  aspectos em que eles convêm e  desconvêm, uns em relação aos outros.

SÚMULA DO PREFÁCIO
Dois aspectos são importantes neste prefácio, e que constituem o seu contexto.
EM PRIMEIRO LUGAR, indica o intento de sua obra.

EM SEGUNDO LUGAR, aponta o método que observará, e o expõe.
Como intento, tratará do GÊNERO, da ESPÉCIE, da DIFERENÇA, do PRÓPRIO 
e do ACCIDENTE, cujo estudo é primacial e fundamental,  não só para a Lógica, 

como, também, para resolver os mais intrincados problemas da Metafísica.


Como método, deixará de lado os problemas sobre qual a SISTÊNCIA de tais 
PRAEDICABILIA, se subsistentes em si mesmos ou se apenas entes de razão, 

porque, tratando-se de matéria que exige mais acurados estudos, não caberia no 

âmbito desta simples introducção, que ele dirige ao seu discípulo CRISAÓRIOS.


PREFÁCIO ISAGOGE
Introducção de PORFÍRIO o Fenício¹,
 discípulo de PLOTINO de Licópolis.

CAPÍTULO 1
DO GÊNERO


CAPÍTULO 2
DA ESPÉCIE

CAPÍTULO 3
DA DIFERENÇA

CAPÍTULO 4
DO PRÓPRIO

CAPÍTULO 5
DO ACCIDENTE

CAPÍTULO 6
DOS CARACTERES 
COMUNS ÀS CINCO VOZES


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